88 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº017 | FORTALEZA, 24 DE JANEIRO DE 2023 visto que o ilícito administrativo independe do ilícito penal. Excepcionalmente, a absolvição criminal só afastará o ato punitivo se ficar provada, na ação penal, a inexistência do fato ou que o acusado não foi seu autor; CONSIDERANDO que, ao se instaurar o processo regular não se objetiva julgar o crime em si, mas o resíduo moral, as consequências do ato na esfera administrativa. O crime é da alçada da Justiça, a transgressão funcional do Poder Executivo, neste caso representado institucionalmente pela CGD. Assim sendo, não obstante a projeção do mesmo fato em instâncias punitivas distintas, visto que as infrações praticadas pelos aconselhados são, ao mesmo tempo, definidas em lei como ilícitos penais e ilícitos administrativos, o processo disciplinar não se presta a apurar crimes propriamente dito, mas, sim, averiguar as condutas e a responsabilidade dos servidores diante de indícios de violação de valores, deveres e da disciplina de sua respectiva Corporação à luz do regramento legal ao qual estejam adstritos. Trata-se, portanto, de um julgamento moral pelos valores que devem nortear a Instituição; CONSIDERANDO que a Administração Pública não necessita aguardar o desfecho do pronunciamento criminal, vez que a previsão do fato criminoso como transgressão disciplinar a autoriza a agir desde logo, aplicando a pena correspondente que sua legislação especí- fica cominar. Sempre foi pacífico que as esferas penal, civil e administrativa são independentes, e, em princípio, não vinculam umas às outras. O militar se sujeita a esta tríplice responsabilidade; CONSIDERANDO que houve a prática de diversas transgressões em concurso material e de agentes, as quais, embora distintas, foram cometidas no mesmo contexto fático, razão pela qual, nesta decisão, preferiu-se analisá-las separadamente de modo a facilitar uma melhor compreensão dos fatos tal como ocorreram e dos respectivos graus de participação dos aconselhados nos resultados verificados; CONSIDERANDO que todas as teses levantadas pela defesa foram devidamente analisadas e valoradas de forma percuciente, como garantia de zelo às bases estruturantes da Admi- nistração Pública, imanados nos princípios regentes da conduta desta, bem como aos norteadores do devido processo legal, não foram suficientes para demover a existência das provas que consubstanciaram as infrações administrativas em desfavor dos aconselhados, visto não terem apresentado justificativa plausível para contestar as imputações que depõem contra suas pessoas; CONSIDERANDO que, respeitado o devido processo legal, restou plenamente demonstrado que os acusados incorreram, na medida das respectivas culpabilidades, nas condutas descritas na Portaria Inaugural do presente feito; CONSIDERANDO que não se vislumbrou neste processo qualquer óbice ou vício de formalidade; CONSIDERANDO que, individualizando-se as condutas e suas respectivas responsabilidades, constatou-se, respectivamente, o seguinte, nos termos dos arts. 37 e 38 da Lei n.º 13.407/2003: a) o CB PM 23.507 Luiz Gonzaga Feitosa do Carmo Filho participou diretamente de todos os fatos, além disso, foi o mentor intelectual do estupro e da tortura perpetrados contra a Sra. A. G. C. L.. Teve o domínio do fato. Participou efetivamente, fomentou e possibilitou que tudo ocorresse sob o manto de seu comando; b) o SD PM 25.792 Paulo Régis de Oliveira, agindo em unidade de desígnios com o CB PM Feitosa, independentemente do fator hierárquico, praticou os atos de estupro e de tortura na mesma intensidade que o comandante da composição, acompanhando-o de forma livre e consciente. Nessa perspectiva, os comprovados comportamentos transgressivos dos acusados aludidos militares, conforme restou suficientemente elucidado nos presentes autos, impõem a exclusão dos mesmos dos quadros da Corporação Policial Militar, visto que as ações por eles praticadas acarretaram sérios danos não apenas à integridade da vitimada, mas também descrédito à Instituição Polícia Militar do Ceará, revelando atitudes frontalmente contrárias aos princípios basilares que fundamentam a razão de existir da referida instituição quase bicentenária. Assim sendo, referidas condutas feriram os valores da moral militar estadual previstos no art. 7.º, bem como malferimento aos deveres consubstanciados no art. 8.º, ofendendo os valores e de deveres contidos no art. 11, § 3.º, caracterizando, deste modo, o cometimento de trans- gressões disciplinares, todos do Código Disciplinar dos Militares do Estado do Ceará (Lei Estadual n.º 13.407/2003); c) o SD PM 25.736 João Victor Machado Firmino, participou indiretamente, de forma omissiva, ou seja, parcial, em tudo que ocorreu no dia 13 de abril de 2016, tendo ciência dos fatos praticados contra a vítima, porém sem esboçar nenhuma atitude que pudesse cessar imediatamente as investidas transgressivas de seus companheiros ou mesmo mini- mizar a gravidade dos atos praticados. Demais disso, negou sua participação e dos demais acusados, mesmo o conjunto probatório amealhado ao processo tendo percorrido o sentido contrário. Nesta linha, com sua conduta feriu os valores da moral militar estadual previstos no Art. 7.º, bem como a violação dos deveres consubstanciados no Art. 8.º, caracterizando, assim, a prática de transgressões disciplinares, todos da Lei Estadual n.º 13.407/2003; d) Por fim, em relação ao SD PM 27.589 Francisco Jales Renovato Júnior, este teve a menor participação na consumação dos atos, pois a própria vítima, além dos demais acusados e das testemunhas, declararam de forma uníssona que ele permaneceu fora dos ambientes onde foram perpetrados os fatos transgressivos resguar- dando a segurança dos locais e da viatura policial, embora tivesse ciência de parte do que ocorria, sem, no entanto, atuar para intervir. Nesta senda, feriu os valores e deveres da moral militar estadual, caracterizando, assim, a prática de transgressões disciplinares; CONSIDERANDO os antecedentes funcionais dos aconselhados (fls. 671/675, 676/678, 679/681 e 682/684): a) O CB PM 23.507 Luiz Gonzaga Feitosa do Carmo Filho, M.F. 302.584-1-X, conforme Resumo de Assentamento às fls. 671/675, foi incluído na PMCE no dia 26 de junho de 2009, contando até o presente com cerca de 13 (treze) anos e 04 (quatro) meses de serviço na Corporação Policial Militar. Atualmente, conforme consulta ao Sistema de Acompanhamento Policial Militar (SAPM), encon- tra-se na categoria de comportamento EXCELENTE, registrando em sua ficha 09 (nove) elogios por bons serviços prestados e nenhuma punição disciplinar; b) O SD PM 25.792 Paulo Régis de Oliveira, M.F. 304.509-1-4, segundo o Resumo de Assentamento às fls. 679/681, foi incluso nos quadros PMCE no dia 08 de setembro de 2010, contando até o presente momento com cerca de 12 (doze) e 02 (meses) anos de serviço ativo na Corporação. Atualmente, encontra-se figurando no comportamento ÓTIMO, registrando em sua ficha funcional 09 (nove) elogios por bons serviços prestados, além de computar 02 (duas) repre- ensões; c) O SD PM 27.589 Francisco Jales Renovato Júnior, M.F. 305.583-1-6, conforme consta no Resumo de Assentamento às fls. 682/684, foi incluso nas fileiras da PMCE no dia 1º de novembro de 2013, contando até a presente data com cerca de 09 (nove) anos de serviços prestados à Corporação Policial Militar. Atualmente encontra-se no comportamento ÓTIMO, registrando 04 (quatro) elogios e nenhuma punição disciplinar em sua ficha funcional; e d) O SD PM 25.736 João Victor Machado Firmino, M.F. 304.453-1-7, segundo o Resumo de Assentamento às fls. 682/684, foi incluso na PMCE no dia 08 de setembro de 2010, contando até o presente momento com cerca de 12 (doze) anos e 02 (dois) meses de serviços prestados à Corporação. Atualmente, encon- tra-se no comportamento, registrando em sua ficha funcional 09 (nove) elogios e computando 01 (uma) Permanência Disciplinar; CONSIDERANDO, por derradeiro, que a Autoridade Julgadora, no caso o Controlador Geral de Disciplina, acatará o relatório da autoridade processante (Sindicante ou Comissão Processante), salvo quando o entendimento exarado for contrário às provas dos autos, ex vi do Art. 28-A, § 4°, da Lei Complementar n° 98/2011; CONSI- DERANDO que, por todo o exposto e por tudo que consta dos autos, instruído o processo em estrita observância ao devido processo legal, respeitando-se as garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório, como medida de direito e de justiça pertinentes ao caso sob apreço, julgo procedente a pretensão acusatória deduzida na Portaria Inaugural; RESOLVO: a) Deixar de acatar a fundamentação exarada no Relatório Complementar emitido pela Comissão Processante (fls. 1014/1017-v), e, acatando os fundamentos assentados no Relatório Final nº272/2019 (fls. 721/759), punir os MILITARES estaduais CB PM LUIZ GONZAGA FEITOSA DO CARMO FILHO – M.F. nº 302.584-1-X, e SD PM PAULO RÉGIS DE OLIVEIRA – M.F. nº 304.509- 1-4, já qualificados nos autos, com a sanção de EXPULSÃO, nos moldes do Art. 24, c/c Art. 33, como decorrência de terem os aludidos aconselhados, livres e conscientemente, em comunhão de desígnios e ações entre si, constrangeram A. G. C. L., com emprego de violência, consistente em coronhadas com o cabo de uma arma de fogo, asfixia com uso de saco plástico na cabeça e na boca (método conhecido como “submarino seco”), dificultando-lhe com isto a respiração, além de afogamento simulado com a submersão em um balde com água, causando-lhe sofrimento físico e mental, assim a torturando, com o fim de obter informações da vítima acerca do suposto paradeiro de um indivíduo alcunhado de “Bucho”, possivelmente envolvido no tráfico de entorpecentes local. Demais disso, não satisfeitos com a aviltante ação relatada, ainda cometeram infamante violência sexual contra a vítima enquanto esta estava sozinha e sem qualquer capacidade de reação frente aos atos praticados pelos acusados, conforme sobejamente comprovado no curso do Processo Regular, haja vista a violação aos valores da moral militar estadual, previstos no art. 7.º (Os valores fundamentais, determinantes da moral militar estadual, são os seguintes), incisos IV (a disciplina), V (o profissionalismo), VI (a lealdade), VIII (a verdade real), IX (a honra), X (a dignidade humana) e XI (a honestidade), bem como malferimento aos deveres consubstanciados no art. 8.º, incisos II (cumprir os deveres de cidadão), IV (servir à comunidade, procurando, no exercício da suprema missão de preservar a ordem pública e de proteger a pessoa, promover, sempre, o bem-estar comum, dentro da estrita observância das normas jurídicas e das disposições deste Código), V (atuar com devotamento ao interesse público, colocando-o acima dos anseios particulares), VIII (cumprir e fazer cumprir, dentro de suas atribuições legalmente definidas, a Constituição, as leis e as ordens legais das autoridades competentes, exercendo suas atividades com responsabilidade, incutindo este senso em seus subordinados), XIII (ser fiel na vida militar, cumprindo os compromissos relacionados às suas atribuições de agente público), XV (zelar pelo bom nome da Instituição Militar e de seus componentes, aceitando seus valores e cumprindo seus deveres éticos e legais), XVIII (proceder de maneira ilibada na vida pública e particular), XXIII (considerar a verdade, a legalidade e a responsabilidade como fundamentos de dignidade pessoal), XXV (atuar com prudência nas ocorrências militares, evitando exacerbá-las), XXVI (respeitar a integridade física, moral e psíquica da pessoa do preso ou de quem seja objeto de incriminação, evitando o uso desnecessário de violência), XXIX (observar os direitos e garantias fundamentais, agindo com isenção, eqüidade e absoluto respeito pelo ser humano, não se prevalecendo de sua condição de autoridade pública para a prática de arbitrariedade) e XXXIII (proteger as pessoas, o patrimônio e o meio ambiente com abnegação e desprendimento pessoal), ofendendo os valores e de deveres contidos no art. 11 (A ofensa aos valores e aos deveres vulnera a disciplina militar, constituindo infração administrativa, penal ou civil, isolada ou cumulativamente), § 3.º (A violação da disciplina militar será tão mais grave quanto mais elevado for o grau hierárquico de quem a cometer), caracterizando, deste modo, o cometimento das transgressões disciplinares dispostas no art. 12, § 1.º (As transgressões disciplinares compreendem), incisos I (todas as ações ou omissões contrárias à disciplina militar, especificadas no artigo seguinte, inclusive os crimes previstos nos Códigos Penal ou Penal Militar) e II (todas as ações ou omissões não especificadas no artigo seguinte, mas que também violem os valores e deveres militares), c/c § 2.º (As transgressões disciplinares previstas nos itens I e II do parágrafo anterior, serão classificadas como graves, desde que venham a ser), incisos II (atentatórias aos direitos humanos fundamentais) e III (de natureza desonrosa) e art. 13, § 1.º (São transgressões disciplinares graves), incisos III (deixar de providenciar para que seja garantida a integridade física das pessoas que prender ou detiver), VI (faltar com a verdade), XXXII (ofender a moral e os bons costumes por atos, palavras ou gestos), XXXIV (desres- peitar, desconsiderar ou ofender pessoa por palavras, atos ou gestos, no atendimento de ocorrência militar ou em outras situações de serviço), XXXVII (deixar de comunicar ao superior imediato ou, na ausência deste, a qualquer autoridade superior toda informação que tiver sobre iminente perturbação da ordem pública ou grave alteração do serviço ou de sua marcha, logo que tenha conhecimento) e LVIII (ferir a hierarquia ou a disciplina, de modo comprometedorFechar