DOU 18/10/2023 - Diário Oficial da União - Brasil
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Nº 198, quarta-feira, 18 de outubro de 2023
ISSN 1677-7042
Seção 1
busca ou analisa exclusão, das exigências técnicas e legais aplicáveis e das condições de
mercado existentes. Tendo isso em mente, as partes interessadas foram convidadas,
quando do início da investigação, a se manifestarem sobre possível exclusão, também do
escopo da medida ora sob análise, do citrato de cálcio, conforme constou da Resolução
GECEX nº 384, de 2022.
495. Também pelas mesmas razões, aclarou-se que eventual exclusão do ácido
cítrico ou do citrato de potássio "grau farma" do alcance da medida antidumping aplicada
à China perpassaria necessariamente pela oferta de oportunidades adequadas de
manifestação às partes, as quais se estendem até o fim das fases probatória (quanto aos
elementos de prova) e de instrução (no que toca às alegações), nos termos do art. 59 e
62 do Decreto no 8.058, de 2013.
496. Entendeu-se, destarte, pela impropriedade de antecipação, já em sede de
determinação preliminar ou por ocasião da divulgação da nota técnica de fatos essenciais, de
juízo tipicamente formado a partir de cognição exauriente. Nessa esteira, alcançado neste
momento, fase processual em que se dá a determinação final e tendo sido dada ampla
oportunidade às partes interessadas para o exercício do contraditório e da ampla defesa no
que concerne ao assunto abordado neste item, registra-se que a seguir são oferecidas as
considerações acerca da redução do escopo da medida e a decisão fundamentada nos
elementos de prova e argumentos apresentados nos autos do processo.
497. Primeiramente, aborda-se o pedido de exclusão do escopo da medida ora
sob análise, do citrato de cálcio, conforme constou da Resolução GECEX nº 384, de 2022,
elaborado pelas empresas produtoras/exportadoras Shandong Ensign e Guoxin Union.
498. Consoante aduzido pelas empresas chinesas, a exclusão do citrato de
cálcio fundou-se no fato de o citrato de cálcio (forma bruta) não ter sido importado a
partir daquelas origens investigadas - Colômbia e Tailândia - nem ter sido produzido pela
indústria doméstica. Ademais, naquela oportunidade, verificou-se que o citrato de cálcio
tetrahidratado se caracterizaria por ser um produto final, utilizado como suplemento
alimentar e cujo custo de produção seria superior ao do ácido cítrico (o que inviabilizaria
economicamente sua utilização como matéria-prima daquele produto). Além disso,
afirmou-se que o objetivo da imposição de uma medida antidumping seria o de
neutralizar os efeitos danosos da prática de dumping à indústria doméstica, que seriam
inexistentes uma vez que o citrato de cálcio não fora produzido pela indústria
doméstica.
499. Tendo em vista as conclusões alcançadas por ocasião da investigação original
encerrada por meio da Resolução GECEX nº 384, de 2022, resta claro que um dos
fundamentos que levaram à exclusão do citrato de cálcio do escopo da medida antidumping
que dela resultou continuaria incontroverso: o citrato de cálcio tetrahidratado continua se
caracterizando como um produto final, utilizado como suplemento alimentar e cujo custo de
produção seria superior ao do ácido cítrico (o que inviabilizaria economicamente sua
utilização como matéria-prima daquele produto). Caberia, portanto, averiguar no presente
caso a existência de importações do citrato de cálcio a partir da China e a existência de
produção desse produto pela indústria doméstica no período de revisão.
500. Conforme verificado nos dados de importação fornecidos pela RFB e nas
respostas ao questionário do produtor/exportador das empresas selecionadas, não
ocorreram operações de importação do citrato de cálcio, qualquer que seja sua forma, no
Brasil, originárias da China durante o período de revisão. Por sua vez, com base nas
informações fornecidas pela indústria doméstica em sede de petição e informações
complementares, e confirmado em procedimento de verificação in loco, não houve
produção brasileira do citrato de cálcio durante o mesmo período. Afigura-se, nesse
seguimento, supridos mais outros fundamentos que levaram à conclusão pela exclusão do
citrato de cálcio do escopo da investigação, encerrada por meio da Resolução GECEX nº
384, de 2022.
501. Dessa forma, cumpridos os mesmos requisitos que foram levantados por
ocasião da investigação original encerrada pela Resolução GECEX nº 384, de 2022, e tendo
em vista o objetivo da imposição de uma medida antidumping, conforme o Artigo VI do
GATT/1994, também no presente caso faz-se necessária a exclusão do citrato de cálcio do
escopo da incidência da medida antidumping ora em revisão.
502. No que diz respeito às manifestações sobre a manutenção do ácido cítrico
e do citrato de potássio monoidratado utilizados como insumo farmacêutico ativo no
escopo do produto sujeito à medida antidumping ora em revisão, discussão levantada
pelas empresas do Grupo Hypera e pela empresa Apsen, a ABIACID de início manifestou-
se no sentido de que os produtos funcionariam tão somente como excipientes, não
possuindo ação farmacêutica ativa e seriam, assim, produzidos pela indústria
doméstica.
503. No que concerne a tais pedidos para exclusão do alcance da medida
antidumping vigente sobre esses produtos, quando utilizados como insumo farmacêutico
ativo (IFA) na produção de medicamentos, a adoção de decisão adequada perpassa,
necessariamente, pelo exame minudente de alguns aspectos, a saber:
- traços distintivos dos produtos em questão e intercambialidade com relação
aos demais itens - incluídos no escopo da medida antidumping;
- confirmação da utilização do ácido cítrico e do citrato de potássio, de fato, como IFA;
- arcabouço regulatório aplicável e suas implicações;
- diferenciação de preços;
- capacidade de produção nacional; e
- existência ou não de efetiva produção e comercialização pelas produtoras brasileiras.
504. As empresas do Grupo Hypera declararam que o ácido cítrico por elas
importado e utilizado como IFA teria sua apresentação na "forma de cristais incolores
translúcidos ou em grânulos finos/pó cristalino branco". Dessa forma, ante essa sucinta
declaração, as empresas não lograram demonstrar a existência de características
diferenciadas em relação ao produto sujeito à medida no que concerne às matérias-
primas, à composição química e às suas características físicas.
505.
Desponta também
das demais
manifestações
acostadas aos
autos
entendimento consensual no sentido de que a particularização do produto para o qual se
requer exclusão não se dá em termos de formulação química. Vale dizer, independentemente
da destinação do produto, sua fórmula química seria a mesma. Não se vislumbrariam assim,
prima facie, razões para sustentar que o produto não poderia compor o escopo da definição
do produto sujeito à medida em vigor.
506. Não expressa isso, todavia, a existência de necessária e absoluta
identidade entre o citrato de potássio empregado como insumo farmacêutico ativo na
manufatura de medicamentos e aquele utilizado como excipiente em fármacos ou mesmo
em outras aplicações. Isso porque, segundo sustenta a Apsen, o citato de potássio
utilizado como IFA sujeita-se a imposições de índole regulatória substancialmente mais
estritas e, por conseguinte, onerosas que aqueles vocacionados a funções diversas,
mormente no que tange ao controle do processo produtivo, à observância de boas
práticas de fabricação e à exigência de licenças/autorizações/registros próprios.
507. No mesmo sentido, as empresas do Grupo Hypera afirmaram que o ácido
cítrico por elas importado seria utilizado como "princípio ativo" (possuindo ação farmacológica),
caracterizando-se, portanto, como insumo farmacêutico ativo. Nessa esteira, a produção do
ácido cítrico "IFA" dependeria de uma série de formalidades com vistas a garantir qualidade e
segurança, tais como estudos de estabilidade e atendimento aos requisitos do Drug Master File
("DMF"). Além disso, estaria sujeito a distinções regulatórias, a critérios de boas práticas de
fabricação, a testes específicos e a exigências de licenças sanitárias distintas daquelas exigidas
para o produto considerado excipiente ou de grau alimentício.
508. Como corolário, empresas que não cumprem todas as exigências sanitárias
específicas para a fabricação de IFA não estariam aptas ao fornecimento do citrato de potássio
monoidratado ou do ácido cítrico para essa finalidade, muito embora possam, eventualmente,
fornecer o produto para outros propósitos, o que afastaria a intercambialidade, ao menos sob o
ponto de vista das empresas que o utilizam como insumo farmacêutico ativo.
509. Tendo isso em vista, há necessidade de apreciação da normativa aplicável
aos diferentes usos do ácido cítrico e do citrato de potássio monoidratado - IFA ,
excipiente e grau alimentício - de forma a apurar se, de fato, os aspectos elencados pelas
empresas do Grupo Hypera e pela empresa Apsen obstariam a aludida substitutibilidade.
Para tanto, examinar-se-ão os seguintes assuntos abordados na regulação brasileira:
- conceitos;
- autorizações e licenças;
- registro, DIFA (Dossiê de Insumo Farmacêutico Ativo) e CADIFA (Carta de
Adequação de Dossiê de Insumo Farmacêutico Ativo);
- boas práticas de fabricação, certificado de boas práticas de fabricação e
demais exigências técnicas;
- regras aplicáveis à importação;
- infrações; e
- fiscalização.
510. A ABIACID em suas manifestações iniciais acerca do tema, alegou que o ácido
cítrico e o citrato de potássio monoidratado seriam considerados insumos farmacêuticos
quando utilizados em medicamentos. Mencionou que, nos termos do art. 4º, inciso III, da Lei
nº 5.991, de 1973, que dispõe sobre o controle sanitário do comércio de drogas,
medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, insumos farmacêuticos seriam definidos
como qualquer droga ou matéria-prima aditiva ou complementar de qualquer natureza,
destinada a emprego em medicamentos, quando for o caso, e seus recipientes.
511. Quando se observa a Lei nº 6.360, de 1976, citada pelas empresas
importadoras, a qual dispõe sobre a vigilância sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, as
drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, cosméticos, saneantes e outros produtos, há a
definição do que seria considerado matéria-prima, que seriam substâncias ativas ou inativas que
se empregariam na fabricação de medicamentos e de outros produtos por ela abrangidos, tanto
as que permanecem inalteradas quanto as passíveis de sofrer modificações.
512. Pode-se extrair dos atos legais mencionados pelas partes interessadas que o
insumo farmacêutico, considerado matéria-prima, poderia ser substância ativa ou inativa que
se empregaria na fabricação de medicamentos, não se elucidando, dessa forma, a existência
de caráter "especialíssimo" para o ácido cítrico e o citrato de potássio monoidratado,
consoante o alegado pelas empresas do Gurpo Hypera e a empresa Apsen.
513. Contudo, recorda-se que as leis são atos gerais e abstratos e que,
normalmente, carecem de regulamentação para tornar exequíveis os seus comandos.
Nesse sentido, buscou-se avaliar a quem competiria a regulamentação infralegal das
funções de controle e vigilância sanitários no Brasil. Verificou-se, dessa forma, que a Lei
nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999, definiu o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e
criou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
514. Já no art 1º da referida lei, ficou determinado que o Sistema Nacional de
Vigilância Sanitária compreenderia o conjunto de ações, executado por instituições da
Administração Pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, que exerçam atividades de regulação, normatização, controle e fiscalização na
área de vigilância sanitária.
515. O art. 2º, a seu turno, estabeleceu que competiria à União no âmbito do
Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, dentre outras funções, a de normatizar, controlar
e fiscalizar produtos, substâncias e serviços de interesse para a saúde, além de determinar
no § 1º deste artigo que a competência da União seria exercida pelo Ministério da Saúde,
pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária e demais órgãos e entidades do Poder
Executivo Federal, cujas áreas de atuação se relacionem com esse sistema.
516. O art. 7º do diploma legal definiu que é de competência da Agência Nacional
de Vigilância Sanitária proceder à implementação e à execução da normatização, do controle
e da fiscalização dos produtos, substâncias e serviços de interesse para a saúde, devendo,
para esse fim, entre outras providências: estabelecer normas, propor, acompanhar e executar
as políticas, as diretrizes e as ações de vigilância sanitária; estabelecer normas e padrões
sobre limites de contaminantes, resíduos tóxicos, desinfetantes, metais pesados e outros que
envolvam risco à saúde; autorizar o funcionamento de empresas de fabricação, distribuição e
importação dos medicamentos de uso humano, suas substâncias ativas e demais insumos,
processos e tecnologias e de comercialização de medicamentos; anuir com a importação e
exportação dos medicamentos de uso humano, suas substâncias ativas e demais insumos;
conceder registros de produtos, segundo as normas de sua área de atuação; conceder e
cancelar o certificado de cumprimento de boas práticas de fabricação; cancelar a autorização
de funcionamento e a autorização especial de funcionamento de empresas, em caso de
violação da legislação pertinente ou de risco iminente à saúde; estabelecer, coordenar e
monitorar os sistemas de vigilância toxicológica e farmacológica; e promover a revisão e
atualização periódica da farmacopeia.
517. Também o Decreto nº 8.077, de 14 de agosto de 2013, o qual regulamenta as
condições para o funcionamento de empresas sujeitas ao licenciamento sanitário, e o registro,
controle e monitoramento, no âmbito da vigilância sanitária, dos produtos de que trata a Lei nº
6.360, de 1976, estabeleceu que o exercício de atividades relacionadas a esses produtos
dependerá de autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e de licenciamento dos
estabelecimentos pelo órgão competente de saúde dos Estados, Distrito Federal ou Municípios,
observados os requisitos técnicos definidos em regulamento desses órgãos.
518. Em face da legislação apresentada, não restam dúvidas de que a normatização,
o controle e a fiscalização dos produtos, substâncias e serviços de interesse para a saúde,
incluindo os medicamentos e os insumos farmacêuticos, é de competência da Agência Nacional
de Vigilância Sanitária. Nesse seguimento, incumbe, então, em face das alegações apresentadas
pelas partes interessadas na presente revisão, analisar detidamente os atos normativos
emanados da citada Agência no que concerne aos insumos farmacêuticos.
519. Seguindo, em face do caráter eminentemente técnico do tema, reputa-se
pertinente, para sua adequada compreensão, a apresentação de alguns conceitos trazidos
pela legislação:
- matérias-primas: substâncias ativas ou inativas que se empregam na
fabricação de medicamentos e de outros produtos, tanto as que permanecem inalteradas
quanto as passíveis de sofrer modificações (Lei no 6.360/1976, art. 3º, XII, e Farmacopeia
Brasileira - 6ª Edição, aprovada pela Resolução de Diretoria Colegiada - RDC nº 298, de
12 de agosto de 2019);
- droga: substância ou matéria-prima que tenha a finalidade medicamentosa
ou sanitária (Lei no 5.991/1973, art. 4º, I);
- medicamento: produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com
finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico (Lei no 5.991/1973, art. 4º,
II). Na mesma linha, para a Farmacopeia Brasileira, medicamento é "o produto farmacêutico,
tecnicamente obtido ou elaborado, que contém um ou mais fármacos e outras substâncias,
com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico";
- insumo farmacêutico: droga ou matéria-prima aditiva ou complementar de
qualquer natureza, destinada a emprego em medicamentos, quando for o caso, e seus
recipientes (Lei no 5.991/1973, art. 4º, III);
- correlato: a substância, produto, aparelho ou acessório não enquadrado nos
conceitos anteriores, cujo uso ou aplicação esteja ligado à defesa e proteção da saúde
individual ou coletiva, à higiene pessoal ou de ambientes, ou a fins diagnósticos e
analíticos, os cosméticos e perfumes, e, ainda, os produtos dietéticos, óticos, de acústica
médica, odontológicos e veterinários (Lei no 5.991/1973, art. 4º, IV);
- excipiente farmacêutico - qualquer componente, que não seja substância
ativa, adicionado intencionalmente à formulação de uma forma farmacêutica (RDC nº
34/2015, art. 2º, XIII).;
- insumo farmacêutico ativo: substância química ativa, fármaco, droga ou matéria-
prima que tenha propriedades farmacológicas com finalidade medicamentosa utilizada para
diagnóstico, alívio ou tratamento, empregada para modificar ou explorar sistemas fisiológicos
ou estados patológicos em benefício da pessoa na qual se administra. Quando destinada a
emprego em medicamentos, deve atender às exigências previstas nas monografias individuais
(Farmacopeia Brasileira - 6ª Edição, aprovada pela Resolução de Diretoria Colegiada - RDC nº
298, de 12 de agosto de 2019). A RDC no 359/2020 traz conceito análogo: qualquer substância
introduzida na formulação de uma forma farmacêutica que, quando administrada em um
paciente, atua como ingrediente ativo, podendo exercer atividade farmacológica ou outro
efeito direto no diagnóstico, cura, tratamento ou prevenção de uma doença, podendo ainda
afetar a estrutura e funcionamento do organismo humano (art. 3º, V).
520. De pronto, conforme manifestações apresentadas pelas partes interessadas e
em consultas realizadas à normativa pertinente, nota-se que as boas práticas de fabricação
para os insumos utilizados como excipientes farmacêuticos, de um lado, e para os insumos
farmacêuticos ativos, de outro, são regidas por atos normativos distintos. Os procedimentos
e as práticas que o fabricante deve aplicar na fabricação de excipientes estão dispostos na
Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 34, de 7 de agosto de 2015, ao passo que os
procedimentos e as práticas que devem ser aplicados na produção de insumo farmacêutico
ativo estão assentados na RDC nº 654, de 24 de março de 2022.
521. O fato de serem aplicadas normas de boas práticas e procedimentos de
fabricação distintos, conforme apontado, já acende o alerta para a potencial existência de
diferenciação entre os usos dos insumos farmacêuticos em termos de normatização,
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