DOE 27/11/2023 - Diário Oficial do Estado do Ceará
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº221 | FORTALEZA, 27 DE NOVEMBRO DE 2023
lização, contudo, associado a questão de que por fato alheio a sua vontade, Aldicélio veio por conta da sua insistência em não ser imobilizado e devido à
resistência, veio cair por sobre o militar, estando encaixado o golpe, e nesta condição, na dinâmica dos corpos e do mencionado estrangulamento, viabilizou
posteriormente o evento morte. Neste prisma, cabe relembrar que o mesmo fato apurado no âmbito da Auditoria Militar do Estado do Ceará, através do
processo nº 254978-97.2020.8.06.0001, entendeu o representante do Ministério Público Militar por oferecer Denúncia em desfavor apenas do Cabo Feitosa,
senão vejamos: (…) Portanto, estas as circunstâncias, DENUNCIO o soldado PM Rafael Renan Feitoza de Oliveira como incurso nas iras do art. 209, § 3º,
do Código Penal Militar, crime de lesão corporal qualificada pelo resultado morte: Art. 209. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem […] Já o
Juiz de Direito da Auditoria Militar do Estado seguiu o mesmo entendimento do Ministério Público ao decidir denunciar apenas o a época Soldado Feitoza,
conforme segue abaixo: (…) Para o promotor de justiça militar, diante das provas obtidas no caderno inquisitorial, somente o SD PM Rafael Renan Feitoza
de Oliveira foi responsável pelo falecimento do barbeiro Aldicélio, posto ter confessado que optou por uma técnica de defesa pessoal, classificada como
estrangulamento (p. 154), razão pela qual foi denunciado pelo cometimento, em tese, do crime de lesão corporal com resultado morte. Constato que a exor-
dial acusatória engloba os requisitos básicos e elementares de admissibilidade, a teor do artigo 77 do Código de Processo Penal Militar, não se vislumbrando
qualquer das circunstâncias ensejadoras de sua rejeição, mencionadas no artigo 78 do mesmo estatuto legal, razão pela qual RECEBO A DENÚNCIA, em
todos os seus termos. (…) Apesar do processo na justiça militar encontrar-se em trâmite, nota-se a compreensão de uma vertente de imputação de conduta
atribuída unicamente ao Cabo Rafael Renan Feitoza de Oliveira. Avaliando as causas e circunstâncias fáticas, podemos notar que o evento morte ocasionado
em Aldicélio, ao nosso sentir, deu-se por causas e circunstâncias inegavelmente alheias a vontade do Cabo Feitoza, até porque, debruçando-se nos autos, seja
neste processo regular (que teve por base uma investigação preliminar bem instruída), com a regular busca de provas documentais, periciais, testemunhais,
ou seja, no aproveitamento da prova emprestada advinda do processo nº 254978-97.2020.8.06.0001 junto a Auditoria Militar do Estado, não conseguimos
vislumbrar o ‘animus necandi’ deliberado do Cabo Feitoza em produzir o evento morte na pessoa de Aldicélio. No que se refere aos preceitos legais, mais
precisamente avaliando a tese da defesa, referente análise das alegações finais, não há embasamento legal, documental, testemunhal e ou pericial para acolher
a tese de legítima defesa com a indicação presente no art. 34, III, da Lei nº 13.407/2003, uma vez que não se vislumbra no caso em concreto a existência dos
pressupostos necessários ao instituto da legítima defesa, a saber: ‘usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente,
a direito seu ou de outrem’. O que ocorreu a nosso ver, foi a conduta de imobilização perpetrada pelo Cabo Feitoza em Aldicélio frente a sua resistência, e
não legítima defesa como sugerido pela defesa. Assim, tal episódio se deu em circunstâncias alheias a vontade do Cb Feitoza, tendo Aldicélio por conta do
golpe de judô encaixado, e como a queda e diante da dinâmica dos corpos, veio ocorrer a lesão na região do pescoço de Aldicélio, gerando dias depois no
seu óbito, mais por certo, importa ressaltar que sem o desejo deliberado do militar processado. Por oportuno, vale lembrar a localidade em que o efetivo
policial estava inserido, Comunidade da Babilônia, local muito conhecido pela incidência de prática criminosa, e ainda por cima, devemos lembrar que foi
localizado drogas e arma de fogo no local vistoriado, associado a situação de insatisfação do abordado. Assim sendo, não acolhemos a tese da defesa quanto
a causa justificante e excludente da conduta atribuída ao Cabo Feitosa pelo que já foi debatido. Por outro lado, é forçoso imputar responsabilidade disciplinar
aos outros policiais aconselhados (2º SGT PM José dos Santos Daniel, CB PM Felipe de Almeida Fermon Viana, e o SD PM Victor Leonardo Matos Rodri-
gues) quanto ao evento apurado, vez que ficou demonstrado até aqui, a não participação dos mesmos, seja direta ou indiretamente, principalmente repercutindo
a individualização da conduta do Cabo Feitoza, por mais que de modo culposo tenha contribuído com a ocorrência em tela. Por todo o exposto, entendemos
que está claro a existência de culpabilidade relativo ao aconselhado Cabo PM Rafael Renan FEITOZA de Oliveira, passível, ao final, após sugestão, de
sanção disciplinar. Outrossim, de modo diverso, reconhecemos inexistir provas suficientes capazes de nos convencer sobre a participação no evento morte
de Aldicélio por parte dos aconselhados: 2º SGT PM José dos Santos Daniel, CB PM Felipe de Almeida Fermon Viana, e o SD PM Victor Leonardo Matos
Rodrigues. Apesar do entendimento aqui proposto, isso não impede a reabertura do processo em desfavor dos policiais supramencionados, caso surjam fatos
novos ou evidências posteriormente à conclusão dos trabalhos, nos termos do inciso III do parágrafo único do art. 72 do Código Disciplinar. […] 6 –
CONCLUSÃO E PARECER Diante da instrução processual, entendemos que as provas coletadas nos autos são suficientes para apontar a culpabilidade do
aconselhado: CB PM RAFAEL RENAN FEITOZA DE OLIVEIRA - MF: 587.444-1-7, razão pela qual pugnamos pela devida punição na seara administra-
tiva diversa da demissão. Isto posto, emitimos parecer, por unanimidade de votos, nos termos do que assim prevê o art. 98, §1º, I e II, da Lei 13.407/2003,
conforme segue: I - É culpado das acusações; II - Não está incapacitado para permanecer na ativa da PMCE. Outrossim, ainda com rigorosa observância ao
conteúdo probatório visto nos autos, relativo aos militares: 2º SGT PM JOSÉ DOS SANTOS DANIEL - MF: 135.790-1-6, CB PM FELIPE DE ALMEIDA
FERMON VIANA - MF: 301.801-1-9 e SD PM VICTOR LEONARDO MATOS RODRIGUES - MF: 308.708-5-9, entendemos que não cabe sugestão de
aplicação de sanção disciplinar na qual emitimos parecer, por unanimidade de votos, nos termos do que assim prevê o art. 98, §1º, I e II, da Lei 13.407/2003,
de modo que cada policial militar processado: 1. Não é culpado das acusações; 2. Não está incapacitado para permanecer na ativa da PMCE. [...]”; CONSI-
DERANDO que a versão apresentada pelos aconselhados CB PM Rafael Renan Feitoza de Oliveira e SD PM Victor Leonardo Matos Rodrigues convergem
que no momento da imobilização realizada pelo CB PM Feitoza, nem os demais aconselhados nem a testemunha João Paulo, parente de Aldicélio estavam
presentes, não obstante isso demonstram dinâmica coerente entre si e com a demais provas nos autos, em análise, principalmente, da possibilidade de insur-
gência de Aldicélio diante da prisão em flagrante por conta das drogas e da arma de fogo ilícita que foram encontradas. Ou seja, atribuindo verossimilhança
às suas versões. Outrossim, verifica-se nos autos que houve esforço dos policiais militares ali presentes no socorro a Aldicélio, levando-o à UPA do Bairro
José Walter, a fim de evitar o resultado morte; CONSIDERANDO ainda que foram apreendidos no local em que estava Aldicélio um revólver cal. 38 (nume-
ração raspada), além de 04 (quatro) munições não deflagradas, 55g de maconha e 48g de cocaína; CONSIDERANDO que conforme o termo do perito-mé-
dico responsável pelo Laudo Cadavérico não havia elementos para atribuir que a causa da morte de Aldicélio tenha decorrido de tortura, bem como não havia
outros sinais de violência além da lesão que causou a morte de Aldicélio; CONSIDERANDO que pelos mesmos fatos tramita Ação Penal Militar, conforme
já expresso no Relatório Final da Comissão Processante, na qual somente fora denunciado o aconselhado CB PM Rafael Renan Feitoza de Oliveira, pela
conduta de lesão corporal seguida de morte; CONSIDERANDO que em consulta pública ao site e-SAJ do TJCE, quanto ao processo protocolizado sob o nº
0254978-97.2020.8.06.0001, verifica-se, a título de informação, Sentença pela improcedência da Denúncia em desfavor do CB PM Feitoza, in verbis: “[…]
O Ministério Público, no uso de suas atribuições, ofereceu Denúncia (p. 81-85), com base no Inquérito Policial Militar instaurado pela Portaria nº 053/2020
-1ºBPCHOQUE/COTAM, datada de 23/01/2020, em desfavor do policial militar, SD PM RAFAEL RENAN FEITOZA DE OLIVEIRA, pela suposta prática
delitiva descrita no art. 209, §3º, do CPM (lesão corporal com resultado morte), tendo como vítima o cabelereiro/barbeiro de nome Aldicélio da Silva Frazão
(31 anos), fato ocorrido na data de 28/12/2019, na rua Topázio, casa 107, no bairro Barroso, nesta cidade de Fortaleza. […]. Afirma a peça acusatória que a
viatura CT 16, ao chegar no local, o CB PM Viana, ficou no veículo policial e os demais ocupantes, ou sejam, o 2º SGT PM Daniel, SD PM Matos e o SD
PM Feitoza entraram na residência de Aldicélio, tendo o 2º SGT PM Daniel encontrado uma certa quantidade de drogas (55 gramas de maconha e 48 gramas
de cocaína) e o SD PM Feitoza localizado um revólver calibre .38, de numeração raspada na lateral da cama do barbeiro. Segundo a narrativa, enquanto os
policiais da CT faziam essa buscas, Aldicélio, deitado ao chão e com as mão amarradas para frente, na sala de seu apartamento, no pavimento superior da
barbearia, ficou sob a custódia do SD PM Matos. De repente, Aldicélio tentou retirar a arma do SD PM Matos, tendo o SD PM Feitoza intervindo naquele
confronto, e aplicado no barbeiro uma técnica de imobilização. Diz a denúncia que logo em seguida, Aldicélio começou a passar mal, como se estivesse
engasgado e apesar dos militares terem feito manobras de desengasgo na vítima, essa não apresentava melhoras, precisando ser conduzida para a UPA do
bairro José Walter. O lesionado Aldicélio ainda passou alguns dias internado mas em 1º/01/2020 veio a óbito. Conforme o laudo pericial (p. 768), a causa
da morte foi asfixia por mecanismo constrictor cervical, tendo sido verificada fratura do osso hioide (fica na parte anterior do pescoço, abaixo da mandíbula
e à frente da porção cervical da coluna vertebral), caso típico de estrangulamento. Para o promotor de justiça militar, diante das provas obtidas no caderno
inquisitorial, somente o SD PM Rafael Renan Feitoza de Oliveira foi responsável pelo falecimento do barbeiro Aldicélio, posto ter confessado que optou por
uma técnica de defesa pessoal, classificada como estrangulamento (p. 154), razão pela qual foi denunciado pelo cometimento, em tese, do crime de lesão
corporal com resultado morte. [...] DECIDO. A materialidade é certa, diante do laudo de p. 768/769, onde é apontada como causa da morte ‘asfixia mecânica
por mecanismo constritor vertical’. Autoria também é certa, pois é incontroverso que tais lesões foram causadas pela ação do acusado. O policial acusado
responde pela conduta delituosa tipificada no art. 209, §3º, que é LESÃO QUALIFICADA PELO RESULTADO. […] Há portanto um crime inicial doloso,
que é a lesão corporal, com resultado não desejado, mas previsível de morte do ofendido. É o crime preterdoloso ou preterintencional, onde coexistem os
dois elementos subjetivos: dolo na conduta antecedente e culpa na conduta consequente. Apesar de provada a materialidade e a autoria, como já destacado
anteriormente, é essencial a análise da conduta do acusado, diante do acervo probatório. […] A prova produzida é frágil para a condenação do policial acusado,
pois ainda persistem dúvidas de que a sua conduta foi lícita, ou seja, de que agiu no estrito cumprimento do dever legal, para impedir que o suspeito (vítima)
se apoderasse da arma. Há evidências nos autos de que o SD FEITOZA agiu para conter a vítima, utilizando a técnica do estrangulamento, mas, por ação da
própria vítima, que ficou se debatendo e chutou o SD MATOS, os dois acabaram caindo, a vítima sobre o acusado. […] Diante da certeza da prática de um
fato típico, importante a análise da ‘ilicitude’ ou ‘anti juridicidade’, que é a relação de antagonismo, de contrariedade entre a conduta do agente e o ordena-
mento jurídico penal, de sorte a causar a lesão ou expor a perigo de lesão um bem jurídico tutelado. Ora, se a norma penal proíbe determinada conduta sob
a ameaça de uma sanção, é porque aquela conduta ou causa lesão ou expõe a perigo de lesão o bem juridicamente protegido. Consequentemente, é de se
concluir que toda e qualquer conduta típica é, em princípio, ‘Ilícita’.A ‘licitude’ de uma conduta típica só será encontrada por exclusão,ou seja, se o agente
praticou alguma conduta tipificada na lei penal, ela só será ‘lícita’ se atuou amparado por uma das ‘causas excludentes de ilicitude’ previstas no art. 42 do
Código Penal Militar, entre as quais encontra-se o ‘estrito cumprimento do dever legal’ e a ‘legítima defesa’. Portanto, as referidas excludentes são perquiridas
no segundo momento da análise da conduta do agente dentro da estrutura jurídica do crime, após verificada a configuração do fato típico. Finalmente, para
se concluir que a conduta do agente é criminosa, mister que, configurado que o fato é típico e ilícito, verificar se o mesmo é também ‘culpável’, se o agente
for ‘imputável’, tiver ‘potencial consciência da ilicitude do fato’ e lhe era ‘exigível uma conduta diversa’ na situação em que se encontrava no momento do
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