DOU 02/10/2024 - Diário Oficial da União - Brasil

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Nº 191, quarta-feira, 2 de outubro de 2024
ISSN 1677-7042
Seção 1
"[...] the problem of overcapacity is expected to become even more acute in the future. Global steelmaking capacity is projected to increase significantly over the next three
years (2024-2026), with 46 mmt of capacity additions underway and an additional 78 mmt in the planning stage. At the same time, prospects for global steel demand growth are clouded
by growing risks of a serious downturn in Chinese steel demand as a consequence of the real estate downturn and its ripple effects on financial markets and the economy."
265. Por meio de uma análise detalhada do funcionamento do Estado chinês, especialmente da relação entre os diversos níveis de Governo, e da sua influência sobre os
produtores domésticos públicos e privados, que foi possível entender de que forma os problemas refletidos no excesso de capacidade instalada decorrem da não prevalência de condições
de economia de mercado no setor do aço.
266. O que os dados apontam, na verdade, é que a alta fragmentação da produção de aço na China e a preponderância de estatais subordinadas nos níveis de Governo
subnacionais explicam em boa parte a dificuldade do Governo central em corrigir o excesso de capacidade instalada. Dados do setor e específicos das empresas mostram que a influência
do Governo central é menor sobre estatais de outros níveis de Governo, os quais possuem preocupações imediatas em termos de emprego e estabilidade social, especialmente em um
cenário pós crise, e que não necessariamente estão alinhadas aos objetivos do Governo central, muito menos aos incentivos de mercado. Neste cenário, a atuação destes entes subnacionais
contribuiu significativamente para viabilizar novos investimentos e a sustentação de prejuízos e dívidas crescentes, descoladas das condições de economia de mercado.
267. Em termos regionais, constam informações acerca do setor siderúrgico chinês. O relatório menciona possíveis atualizações da estratégia do governo chinês no que tange
à renovação da capacidade instalada do país para a implantação de fábricas mais novas e eficientes. Salienta-se ainda ter ocorrido expansão de capacidade de algumas empresas chinesas,
a despeito dos esforços do governo para a redução da sobrecapacidade.
268. Pelo exposto, dados atualizados sobre a situação do mercado siderúrgico mundial indicam a manutenção do cenário de sobrecapacidade, com participação relevante de
produtores chineses
5.2.1.3.2. Da estrutura de mercado e da participação e do controle estatal na China
269. É importante ressaltar que a propriedade estatal de empresas no setor siderúrgico não pode ser considerada, individualmente, como um fator determinante para se atingir
uma conclusão a respeito da prevalência de condições de economia de mercado em determinado setor. Sabe-se, por exemplo, como demonstrado no Relatório "Empresas Estatais no Setor
de Aço" da OCDE (2018), "State Enterprises", que havia participação estatal relevante no setor de aço mundial até pelos menos o final do século XX. Apenas a partir de meados da década
de 1980, primeiramente com a Europa e depois nos países da antiga União Soviética e América Latina é que a propriedade estatal se reduziu significativamente. De acordo com o mesmo
estudo, os governos teriam vários motivos para intervir no setor siderúrgico, que muitas vezes é considerado estratégico, uma vez que serviriam a propósitos de desenvolvimento industrial
ou mesmo de defesa nacional.
270. Conforme estudo da OCDE (2018), a definição de empresas estatais (SOEs) é um desafio porque envolve determinar o grau de controle que o estado pode exercer sobre
uma empresa. Segundo ele, a propriedade estatal pode não ser uma condição suficiente para determinar o controle estatal. Entender como as ações de propriedade se relacionam com
direitos de voto ou decisão no conselho executivo de uma empresa ou em outros órgãos de governança é difícil, mas, na visão da OCDE, particularmente importante.
271. Ademais, mesmo na ausência de controle estatal, os regulamentos ou a presença nos órgãos de governança da empresa podem fornecer margem suficiente para o Estado
influenciar o processo de tomada de decisão. A variedade de circunstâncias e a falta de transparência sobre como o controle e a influência do Estado podem ser exercidos torna a análise
de políticas bastante complexa.
272. O estudo também salientou este problema, e adicionou que há diferentes metodologias para se estimar a representatividade das SOEs no setor. Ainda, salientou que a
atuação das estatais submetidas ao governo central, provincial ou municipal não podem ser vistas como um padrão monolítico, dados os conflitos de interesse entre os níveis de governo.
Em outras palavras, as políticas públicas de estímulo às indústrias siderúrgicas chinesas diferem de acordo com o nível de governo, o que é um indicativo da existência de incentivos com
efeitos contraditórios sobre o setor.
273. Os dados mostraram que as empresas estatais são particularmente importantes na China. Entre as principais indústrias siderúrgicas do país, todos os dados indicam que
a maioria é estatal. Quanto ao universo das indústrias de aço, os números apontam para participação ainda relevante, mas decrescente. Estimativa de um estudo de 2010 colocou que
a produção de aço de empresas estatais representava 63%. Outro, referente ao ano de 2017, dizia que em 2005 a participação era de 65% em 2005, mas teria declinado fortemente para
43,4% em 2017. A Comissão Europeia, em 2017, estimou em 49% essa participação. Já no relatório de 2024, dados atualizados do documento europeu indicam que essa participação gira
em torno de 40% da produção e capacidade produtiva de aço na China.
274. Assim, é possível afirmar, com base nos dados trazidos aos autos, que a participação de estatais na produção chinesa de aço é representativa, mas também que, ao mesmo
tempo, a participação do setor privado tem aumentado e já representa parcela superior à das estatais, cerca 60% da produção e capacidade produtiva de aço na China de acordo com
relatório da Comissão Europeia de 2024 já apresentado.
275. Outro aspecto relevante presente no estudo se refere à participação das empresas locais entre as empresas estatais. Segundo os dados apresentados, a maior parte da
produção de aço na China é originária de empresas subnacionais. Este dado é consistente com a história da indústria chinesa de aço, que cresceu de modo extremamente fragmentado
desde o final dos anos 1950. Esta informação é fundamental, uma vez que, como será visto, as diretrizes e metas são elaboradas pelo Governo central, de modo que o alinhamento dos
demais níveis de Governo podem não ser automáticos.
276. Além da propriedade direta de empresas, contudo, o controle do Governo pode ser exercido de facto por meio de uma série de meios. Nesse aspecto, cabe ressaltara
complexa relação entre o Estado, o Partido Comunista Chinês e empresas estatais e privadas. Empresas (inclusive privadas como a Shagang, a maior siderúrgica privada da China) possuem
Comitês do Partido em suas estruturas e executivos de alto escalão que não são apenas filiados ao Partido, mas que apresentam currículo extenso com passagens em diversos postos do
Estado e do Partido.
277. Conforme art. 19 da Lei das Companhias da China, uma organização do Partido Comunista deve ser estabelecida em uma empresa para realizar atividades do Partido que
estejam de acordo com a Constituição do Partido Comunista da China. Ademais, determina que a empresa deveria fornecer as condições necessárias para as atividades da organização.
O art. 30 da Constituição do Partido Comunista da China, por sua vez, estabelece que uma organização primária do PCC deve ser formada em qualquer empresa [...] onde há três ou mais
membros do Partido.
278. A Constituição do PCC ainda diferencia os papéis que o Partido Comunista deveria exercer em empresas estatais e privadas. Conforme art. 33, em empresas estatais, entre
outras coisas, o Comitê deve desempenhar um papel de liderança, definir a direção certa, ter em mente o panorama geral, assegurar a implementação das políticas e princípios do Partido,
discutir e decidir sobre questões importantes da sua empresa. Ademais, deve garantir e supervisionar a implementação dos princípios e políticas da Parte e do Estado dentro de sua própria
empresa e apoiar o conselho de acionistas, conselho de administração, conselho de supervisores e gerente (ou diretor de fábrica) no exercício de suas funções e poderes de acordo com
a lei. Deve ainda exercer liderança sobre o trabalho dos Sindicatos.
279. No que se refere às empresas privadas, as entidades devem, entre outras coisas, implementar os princípios e políticas do Partido, orientar e supervisionar a observância
das leis e regulamentos estatais, exercer liderança sobre sindicatos, promover unidade e coesão entre trabalhadores e funcionários e promover o desenvolvimento saudável de suas
empresas.
280. Fica claro que o regulamento permite um grau de controle maior do Comitê do Partido sobre as empresas estatais. Regulamentos do Partido emitidos em junho de 2015
indicam que o Secretário do Comitê de uma estatal deve ser determinado conforme a estrutura de governança interna da empresa. Isto significa que, na prática, dificilmente será nomeado
Secretário do Comitê uma pessoa que não seja o próprio Presidente ou algum Diretor da empresa.
281. Diante do exposto, foi possível concluir que a presença do Estado chinês, seja ele central ou subnacional, é massiva no setor de aço. A participação das empresas
formalmente estatais na produção chinesa é bastante significativa, e é maior nos níveis locais. Além do simples controle societário, contudo, há outros aspectos que tornam o controle
do Estado e do PCC ainda mais profundo no âmbito das empresas, inclusive privadas, como a atuação dos Comitês do Partido dentro da estrutura das empresas e o fato de os Sindicatos
dos trabalhadores estarem submetidos às empresas e ao Partido.
5.2.1.3.3. Das metas e diretrizes do Governo e sua influência sobre empresas estatais e privadas
282. Ainda que outros países elaborem políticas industriais em formatos semelhantes, este Departamento desconhece alegações de que nestes países não haja prevalência de
condições de economia de mercado, independentemente do segmento produtivo. Por fim, como visto no primeiro item deste posicionamento, foi a China o país que decisivamente
contribuiu para o excesso de capacidade instalada mundial, de modo que, sejam quais tenham sido as políticas implementadas em outros países, não há qualquer indício de que distorções
significativas tenham origem nestes países.
283. A análise dos Planos em questão levou à conclusão de que o Governo central claramente procura estabelecer diretrizes a serem seguidas pelos agentes econômicos
do segmento siderúrgico. O documento base que serve de orientação é o Plano Quinquenal, que estabelece as diretrizes e metas mais gerais para a economia. Há também os Planos
específicos, derivados dos Planos Quinquenais, que detalham diretrizes e metas por setor produtivo. No âmbito das Províncias e Municípios, é esperado que estes níveis de Governo
também elaborem os seus Planos, sempre de acordo com as diretrizes e metas estabelecidas pelo Governo central.
284. No caso da investigação de subsídios acionáveis nas exportações para o Brasil de produtos laminados planos a quente originárias da China, e de dano à indústria
doméstica decorrente de tal prática, encerrada por meio da Resolução CAMEX nº 34, de 21 de maio de 2018, publicada em edição extra do Diário Oficial da União da mesma data,
os diversos planos governamentais conhecidos foram determinantes para identificação do caráter estratégico do setor siderúrgico chinês, o que se refletia na destinação de relevantes
subsídios às empresas investigadas:
208. Segundo informações apresentadas pelas peticionárias, a estratégia chinesa para promover o rápido crescimento da sua economia é definida em suas políticas industriais,
tanto de nível nacional quanto de nível local. Nesse sentido, a indústria siderúrgica é reiteradamente identificada como fundamental para o desenvolvimento chinês e,
consequentemente, possui prioridade no recebimento de subsídios governamentais. Os subsídios concedidos fazem parte da estratégia do governo de "direcionar capital estatal para
indústrias relevantes para a segurança e economia nacional através da injeção discricionária e racional de capital", conforme os planos e políticas destacados abaixo:
a) planos quinquenais (Five-Year Plan), do oitavo ao décimo terceiro, cobrindo o período de 1991 a 2020;
b) políticas específicas para o setor siderúrgico - "Iron and Steel Development Policy", "Iron and Steel Industry Adjustment and Revitalization Plan" ("Steel Adjustment Plan"),
de 2009, "Iron and Steel Industry 12th Five Year Plan", de 2011, "Iron and Steel Normative Conditions", de 2012, e "Guiding Opinions on Resolving the Problem of Severe Excess
Capacity", de 2013;
c) políticas de apoio científico e tecnológico - "Guideline for the National Medium and Long Term Science and Technology Development Plan", "National Medium and Long
Term Science and Technology Development Plan", "Decision on Implementing the Science and Technology Plan and Strengthening the Indigenous Innovation", todas de 2006; e
d) políticas de direcionamento de investimentos - "Decision of the State Council on Promulgating and Implementing the Temporary Provisions on Promoting Industrial
Structure Adjustment", de 2005, e "Provisions on Guiding the Orientation of Foreign Investment", de 2002.
285. Naquele caso, restou evidente que os diversos planos existentes apontavam o setor siderúrgico como prioritário para recebimento de subsídios concedidos pelo governo
chinês.
286. Apesar deste conjunto de documentos, a influência que o Governo central efetivamente exerce sobre o setor siderúrgico parece depender de uma série de elementos,
como o setor produtivo, se a empresa é de propriedade estatal ou privada, se a empresa é estatal central ou local e, até mesmo, de empresa para empresa.
287. Talvez o tema que mais ilumine essa discussão seja o problema da fragmentação da produção de aço na China. Trata-se de um diagnóstico constantemente apontado
pelos Planos Quinquenais 11º, 12º, 13º e 14º e nos Planos setoriais decorrentes, os quais cobrem o período de 2005 a 2025. Como consequência deste problema, o Governo central
chinês procurou aumentar a concentração de mercado, estabelecendo metas de participação de mercado das maiores empresas e, até mesmo, determinando explicitamente as empresas
que deveriam realizar fusões com este propósito.
288. Como se pôde observar a partir das metas estabelecidas em cada um dos Planos, estas não puderam ser cumpridas, especialmente na década atual. A meta de
participação das dez maiores empresas estabelecida pela "Política de Desenvolvimento da Indústria Siderúrgica da China" (PDISC) (2005) previa aumento de participação de 34,7% para
50% em 2010, e quase foi atingida (48,6%). Contudo, de acordo com o 12º Plano Quinquenal, esta participação deveria chegar a 60% em 2015, mas o que se confirmou foi um
decréscimo significativo, fazendo com que a participação de mercado das dez maiores empresas fosse ainda menor do que aquela atingida em 2005 (34%). Este período, recorda-se,
coincide com um aprofundamento da capacidade ociosa mundial e com o ápice da participação chinesa na capacidade instalada mundial.
289. Adicionalmente, nota-se que um dos objetivos do 13º Plano Quinquenal (2015-2020) é "promover a fusão, modernização e reestruturação de empresas com baixo
desempenho", evidenciando o insucesso do Governo central em atingir os seus objetivos até então. O 13º Plano Quinquenal adotou um tom mais rigoroso nas suas diretrizes voltadas
à diminuição das distorções observadas, inclusive proibindo governos locais e agências de aprovarem novos projetos e adições de capacidade instalada. Como visto, em 2016 e 2017
houve, efetivamente, uma redução da capacidade instalada líquida no país. Isso não obstante, além do nível de ociosidade ainda ser muito elevado, a maior parte das reduções de
capacidade foi realizada por empresas privadas e, no setor público, lideradas por empresas de grande porte mais próximas do Governo central. Estas últimas, por seu turno, obedecem
majoritariamente a metas pré-definidas em nível administrativo, que não necessariamente refletem uma alocação de recursos em que prevaleçam condições de economia de
mercado.
290. O 14º Plano Quinquenal (2021-2025), por sua vez, enfatizou a necessidade de aumentar a competitividade das indústrias de base e de transformação, incluindo o setor
siderúrgico.

                            

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