DOU 24/04/2025 - Diário Oficial da União - Brasil

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Nº 77, quinta-feira, 24 de abril de 2025
ISSN 1677-7042
Seção 1
182. Dados atualizados da OCDE, apresentados no Relatório Latest Developments in Steelmaking Capacity 2023, indicam que a expansão da capacidade continua a um ritmo
robusto, frequentemente em busca de mercados para exportação. Apenas em 2022, a capacidade global de produção de aços aumentou em 32,1 milhões de toneladas métricas (mmt)
alcançando 2.459,1 mmt, o nível mais elevado de capacidade global na história. O relatório ainda indica que a capacidade de produção mundial deve continuar a expandir nos próximos
anos, sendo que a China e a Índia, os dois maiores produtores de aço, continuarão a representar cerca da metade da capacidade global de produção de aço.
183. Embora o relatório citado aponte que a capacidade de produção de aços na China foi reduzida por quatro anos consecutivos, até 2018, observa-se, contudo, que tal
capacidade tem aumentado desde então, de modo que alcançou 1.149.9 mmt, em 2022.
184. Apesar do crescimento da capacidade, a demanda mundial por aço não acompanhou o mesmo ritmo. Este desequilíbrio levou a uma capacidade ociosa significativa,
contribuindo para a redução dos preços do aço no mercado internacional e pressionando as margens de lucro das siderúrgicas fora da China. Essa situação é exacerbada pelo apoio estatal
contínuo às siderúrgicas chinesas, que, apesar de operarem frequentemente com margens negativas, continuam a aumentar sua produção e exportações.
185. Com relação à deterioração da saúde financeiras das empresas do setor, a OCDE, em estudo de 2015, já havia sublinhado o problema, ao concluir que o desempenho
financeiro da indústria siderúrgica global havia se deteriorado para níveis não vistos desde a crise do aço no final da década de 1990. Ademais, afirmou que havia uma relação
estatisticamente significativa entre a capacidade excedente e a lucratividade e o endividamento da indústria.
186. Segundo a OCDE, o excesso de capacidade afeta a lucratividade por meio de vários canais:
Dois canais principais são os custos e preços. Por exemplo, em períodos de baixa utilização de capacidade, as economias de escala não são totalmente exploradas e, assim,
os custos são mais altos e os lucros mais baixos. Os preços também tendem a ser menores durante períodos de baixa utilização da capacidade, impactando diretamente os lucros. No
nível global, os efeitos do excesso de capacidade são transmitidos através do comércio; excesso de capacidade pode levar a surtos de exportação, levando a quedas de preços e perdas
de quota para produtores domésticos concorrentes na importação (OCDE, 2015).
187. Por meio de uma análise dos balanços de empresas siderúrgicas listadas, o estudo analisou indicadores como o fluxo de caixa das empresas, relação dívida/lucro
operacional antes de juros, impostos, depreciação e amortização e as oportunidades de investimento (price-to-book ratio), concluindo que as indústrias deste setor estariam precisando
de fundos externos para cobrir os investimentos ou mesmo manter as atividades operacionais, que o endividamento está tão elevado que trazem questionamentos quanto à solvência
delas, e que as oportunidades de investimentos são escassas, ou praticamente inexistentes.
188. O DECOM já identificou, em investigações de defesa comercial anteriores, que a margem de lucro das indústrias siderúrgicas chinesas é, em média, mais baixa do que
a de suas congêneres do resto do mundo. Segundo a McKinsey, estas margens não permitiriam a sobrevivência das empresas nem mesmo no curto prazo.
189. O estudo da OCDE (2018) sugere que as estatais são mais propensas a registrar períodos mais longos de resultados negativos em comparação com suas contrapartes
privadas, e que estão significativamente e positivamente correlacionadas com a persistência em perdas financeiras.
190. Tais cenários de lucratividade reduzida e endividamento crescente parece não ter se alterado de forma significativa nos últimos anos, consoante informações apresentadas
pelas peticionárias, como o artigo já mencionado China Commodity trip: a not yet bottomed construction sector; potentially more robust green demand, de 2024, da Goldman Sachs.
191. Além disso, a participação de empresas estatais chinesas no setor siderúrgico é historicamente conhecida. Segundo o relatório do Instituto Aço Brasil, em 2015, havia 159
mil empresas estatais na China, das quais 25 mil estavam no setor de manufatura, incluindo a siderurgia. Dentre as 50 maiores siderúrgicas do mundo em 2010, 17 eram estatais, e 15
destas eram chinesas, destacando o papel predominante das empresas estatais no cenário global. A Comissão Europeia, em 2017, estimou em 49% a participação de empresas estatais
na produção de aço.
192. Segundo as peticionárias, quatro das seis das principais siderúrgicas chinesas seriam estatais e estariam entre as 10 maiores produtoras do mundo e citaram a China Baowu
Group, HBIS Group, a Ansteel Group e a Shougang Group. Como maiores produtoras de aços laminados planos revestidos, citou a Angang Steel Company Limited, Baosteel Group
Corporation, Begang Steel Plates Co. Ltd, Wuhan Iron and Stee ("Grupo Wisco"), HBIS Group, Changshu Everbright Material Technology Co. Ltd. e Shougang Group.
193. A esse respeito, cabe mencionar que a participação das empresas estatais tem fulcro nos diversos planos governamentais elaborados pelo Governo da China. Pode-se dizer
que o plano mais importante são os Planos Quinquenais, arcabouço normativo principal do Governo da China que estabelece as diretrizes e objetivos mais gerais para a economia. Há
também planos específicos e setoriais, derivados dos Planos Quinquenais, que detalham diretrizes e metas por setor produtivo. No âmbito das províncias e municípios, observa-se também
que há planos subnacionais, sempre de acordo com as diretrizes e objetivos estabelecidos pelo governo central.
194. O 14º Plano Quinquenal, que cobre o período de 2021 a 2025, continua a promover o setor siderúrgico como uma prioridade nacional e enfatiza a necessidade de
aumentar a competitividade das indústrias de base e de transformação, incluindo a desse setor. Este plano, juntamente com o 14º Plano Quinquenal para o Desenvolvimento da Indústria
de Matérias-Primas, estabelece metas específicas para a inovação tecnológica, a eficiência energética, e a produção de aço de alto valor agregado. Além disso, a iniciativa "Made in China
2025" continua a desempenhar papel crucial na definição das políticas industriais, com foco em reduzir a dependência de tecnologia estrangeira e aumentar a competitividade global.
195. No âmbito da investigação de subsídios acionáveis nas exportações para o Brasil de produtos laminados planos a quente originárias da China, encerrada por meio da
Resolução CAMEX no 34, de 21 de maio de 2018, publicada em edição extra do Diário Oficial da União da mesma data, os diversos planos governamentais conhecidos foram determinantes
para identificação do caráter estratégico do setor siderúrgico chinês, o que se refletia na destinação de relevantes subsídios às empresas investigadas:
[...] a estratégia chinesa para promover o rápido crescimento da sua economia é definida em suas políticas industriais, tanto de nível nacional quanto de nível local. Nesse
sentido, a indústria siderúrgica é reiteradamente identificada como fundamental para o desenvolvimento chinês e, consequentemente, possui prioridade no recebimento de subsídios
governamentais. Os subsídios concedidos fazem parte da estratégia do governo de "direcionar capital estatal para indústrias relevantes para a segurança e economia nacional através da
injeção discricionária e racional de capital", conforme os planos e políticas destacados abaixo:
a) planos quinquenais (Five-Year Plan), do oitavo ao décimo terceiro, cobrindo o período de 1991 a 2020;
b) políticas específicas para o setor siderúrgico - "Iron and Steel Development Policy", "Iron and Steel Industry Adjustment and Revitalization Plan" ("Steel Adjustment Plan"),
de 2009, "Iron and Steel Industry 12th Five Year Plan", de 2011, "Iron and Steel Normative Conditions", de 2012, e "Guiding Opinions on Resolving the Problem of Severe Excess Capacity",
de 2013;
c) políticas de apoio científico e tecnológico - "Guideline for the National Medium and Long Term Science and Technology Development Plan", "National Medium and Long Term
Science and Technology Development Plan", "Decision on Implementing the Science and Technology Plan and Strengthening the Indigenous Innovation", todas de 2006; e
d) políticas de direcionamento de investimentos - "Decision of the State Council on Promulgating and Implementing the Temporary Provisions on Promoting Industrial Structure
Adjustment", de 2005, e "Provisions on Guiding the Orientation of Foreign Investment", de 2002". (grifo nosso)
196. Na investigação citada de subsídios acionáveis, restou evidente para a autoridade investigadora brasileira que os diversos planos existentes apontavam o setor siderúrgico
como estratégico para o Governo da China, tendo preferência para recebimento de subsídios concedidos por esse governo.
197. A influência que o Governo da China exerce sobre o setor siderúrgico pode ser notado na tentativa do governo de enfrentar o problema da fragmentação da produção
de aço na China. Trata-se de desafio que foi constantemente apontado pelos Planos Quinquenais 11º, 12° e 13°, e nos Planos setoriais decorrentes, os quais cobrem o período de 2005
a 2020.
198. Como consequência desse problema, o governo central chinês procurou aumentar a concentração de mercado, estabelecendo metas de participação de mercado das
maiores empresas e, até mesmo, determinando explicitamente as empresas que deveriam realizar fusões com esse propósito.
199. As diretrizes estabelecidas acerca da necessidade de concentração de mercado tiveram efeito direto na organização do setor siderúrgico na China. A esse respeito, pode-
se mencionar o caso do Grupo Baosteel, que se tornou a maior siderúrgica da China após a concretização da fusão com outra empresa estatal ligada ao governo central, a WISCO. Esta
fusão era uma meta já prevista no "Iron and Steel Industry Adjustment and Revitalization Plan" ("Steel Adjustment Plan") em 2009 e, embora tenha levado alguns anos para se efetivar,
foi finalmente levada a cabo no final de 2016.
200. Outra fusão prevista no Steel Adjustment Plan, foi a fusão da Bengang Plates com a Anshan. Aquela empresa é uma estatal ligada ao Governo da Província de Liaoning,
com fortes vínculos com o desenvolvimento municipal e provincial, enquanto esta é uma empresa estatal ligada ao governo central. Essa fusão, todavia, não se concretizou por
"divergências de interesse" e "desgaste político".
201. Já a empresa TPCO, estatal ligada ao Município-Província de Tianjin, uniu-se a três outras empresas do Município já em 2010, consoante diretriz prevista no Steel
Adjustment Plan. Contudo, a fusão foi desfeita em 2016 pelo Governo de Tianjin no âmbito de um conturbado processo de reestruturação da dívida do Grupo.
202. Além disso, observa-se que estatais ligadas ao governo central tendem a se alinhar mais automaticamente às diretrizes explícitas de planos elaborados pelo governo central
chinês, de forma que os encerramentos de linhas de produção poderiam ter caráter meramente de medidas administrativas, sem preocupações com a eficiência alocativa.
203. Cabe destacar que, a despeito de a estrutura do mercado siderúrgico chinês ser fortemente caracterizada pela influência e controle estatais, evidenciando intervenção
governamental significativa que se estende a todos os níveis da economia, a propriedade de empresas estatais, por si só, não determina a ausência de condições de mercado, mas sim
a maneira como o controle é exercido pelo Estado. Mesmo na ausência de controle de empresas estatais, os regulamentos ou a presença nos órgãos de governança de empresas podem
fornecer margem suficiente para o Estado influenciar o processo de tomada de decisão. A variedade de circunstâncias e a falta de transparência sobre como o controle e a influência
do Estado podem ser exercidos torna a análise de políticas bastante complexa. O Relatório "Empresas Estatais no Setor de Aço" da OCDE (2018), "State Enterprises " salientou esse
problema, e adicionou que há diferentes metodologias para se estimar a representatividade das SOEs no setor siderúrgico. Ainda, salientou que a atuação das empresas estatais submetidas
ao governo central, provincial ou municipal não podem ser vistas como um padrão monolítico, dados os conflitos de interesse entre os níveis de governo. Em outras palavras, as políticas
públicas de estímulo às indústrias siderúrgicas chinesas diferem de acordo com o nível de governo, o que é um indicativo da existência de incentivos com efeitos contraditórios sobre
o setor.
204. De todo modo, é relevante mencionar que, além da questão da propriedade e controle de empresas estatais, observa-se que o setor siderúrgico chinês é significativamente
beneficiado por subsídios governamentais, o que lhes permite manter operações e exportações em níveis elevados, independentemente da lucratividade. A intervenção governamental,
não só por meio do controle de empresas estatais, mas também por meio da concessão de subsídios, tem impacto direto na dinâmica do setor.
205. No período pós-crise financeira de 2008, a concessão de subsídios no setor siderúrgico chinês parece ter acelerado, o que pode ser atestado pelo número de casos de
medidas compensatórias iniciados contra a China nos últimos anos.
206. Com base em dado extraído do Integrated Trade Intelligence Portal (I-TIP) da OMC, referente aos códigos SH 72 e 73, foram iniciadas 78 investigações de subsídios sobre
as importações chinesas de aço até 2020, sendo todas elas iniciadas depois de 2007.
207. A esse respeito, vale recordar que, em 2018, a autoridade investigadora brasileira concluiu pela existência de subsídios acionáveis nas exportações de produtos planos
laminados a quente da China para o Brasil, e de dano à indústria doméstica decorrente de tal prática, recomendando a aplicação de medidas compensatórias. Cópia da referida decisão
pode ser obtida em https://www.in.gov.br/web/dou/-/resolucao-no-34-de-21-de-maio-de-2018-15165833.
208. Nessa investigação de subsídios acionáveis, o então DECOM concluiu que, dos 25 programas de subsídios acionáveis identificados no início da investigação, 11 geraram
benefícios às empresas investigadas cooperantes. Foram eles: (1) Empréstimos preferenciais; (2) Do seguro e da garantia ao crédito de produtos exportados; (3) Injeções de capital; (4)
Subsídios previstos na "Law of The People's Republic of China on Enterprise Income Tax"; (5) Deduções do Imposto Sobre o Valor Agregado (VAT); (6) Isenção de Imposto de Importação
e Imposto sobre o Valor Agregado (VAT); (7) Fornecimento pelo Governo Chinês de Bens e Serviços a Preços Reduzidos (Terrenos, Recursos Minerais, Energia elétrica); (8) Fundo para
projetos Tecnológicos; (9) Fundo para redução da Emissão de Gases e conservação de energia; (10) Fundos para Desenvolvimento do Comércio Exterior; e (11) Fundo para Controle da
Produtividade.
209. No caso do programa de empréstimos preferenciais investigado pelo DECOM no âmbito do caso de laminados a quente citado, também foi possível encontrar elementos
concretos acerca dos subsídios que beneficiam o setor siderúrgico:
"309. Nesse sentido, além de controlar os principais bancos do mercado chinês, o Governo da China também influencia as decisões dos agentes bancários por meio da lei "Law
of the People's Republic of China on Commercial Banks", que dispõe em seu artigo 34 sobre a obrigatoriedade de os bancos atuarem em conformidade com a orientação da política
industrial do Estado, conforme transcrito abaixo:
Article 34 Commercial banks shall conduct their business of lending in accordance with the needs of the national economic and social development and under the guidance
of the industrial policies of the State. (grifo nosso)
310. Insta salientar que tal artigo não faz distinção entre bancos comerciais estatais e bancos comerciais ditos privados, o que só reforça a constatação de que o sistema
bancário chinês, como um todo, se sujeita às diretrizes do Estado.
[...]
314. Ainda quanto à intervenção no sistema bancário, o documento "IMF Working Paper - Financial Distortions in China: A General Equilibrium Approach" , de 2015, aponta
como as principais distorções existentes do sistema financeiro chinês, que potencializaram o crescimento do país, o controle das taxas de juros pelo Banco Central Chinês, além da
"garantia implícita" de que o governo jamais deixaria que uma empresa estatal não pagasse seus empréstimos:
While a succession of market-oriented reforms has transformed China into the second largest economy in the world, financial sector reforms have been lagging behind. Interest
rates used to be heavily controlled and had been liberalized only gradually. Even more entrenched is the system of implicit state guarantees covering financial institutions and corporates
(particularly state-owned), giving an easier access to credit to entities perceived to be backed by the government. Why have these distortions survived for that long, even as the rest
of the economy has been undergoing a transition to a market-oriented system? They have been an integral part of the Chinas growth story. Low, administratively-controlled interest rates

                            

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